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Livros impossíveis (sobre Astronautilia) - Parte 1

6/22/2017

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Existem certos livros que parecem não existir – ou melhor, parecem existir apenas como uma possibilidade ficcional, um tipo de interação imaginária. Desde Rabelais, que fazia seu gigante Pantagruel empregar seu tempo lendo obras-primas imaginárias que incluíam um guia seguro para a flatulência em público, escrito por certo Magister Noster Ortuinus, não poucos autores povoaram sua ficção, seu universo compartilhado com a realidade, de obras livros impossível. São volumes que, caso existissem de fato (pois isso parece improvável, uma realização técnica inviável), seriam como o volume perdido da Encyclopedia Britannica encontrada por Jorge Luis Borges e Adolfo Bioy Casares no conto “Tlön, Uqbar, orbis Tertius” – parte de uma conspiração que visa demolir os alicerces de nossa realidade. Mas, certos momentos, cruzamos com esses livros imaginários; nosso tato reconhece suas texturas, a suavidade de suas páginas e a graciosa lisura de sua capa. O momento em que encontramos livros imaginários (ou que poderiam ser imaginários) é como se encontramos uma brecha na continuidade de uma realidade cotidiana, sistemática, prosaica, imanente. Posso dizer que, algumas vezes em minha vida, encontrei esses volumes semi-imaginários nos mais diversos locais – bibliotecas, pequenas livrarias, bancas de livros usados em plena rua, livrarias virtuais, sites de pequenas editoras artesanais (parte desses livros, aliás, foram resenhados aqui, neste blog, que surgiu por causa deles).

​Um dos últimos encontros com esses livros que parecem tornar o tecido da realidade mais delgada e fácil de se esgarçar – para se romper e se tornar um pedaço mutável do imaginário – foi com o inacreditável livro Astronautilia/Hvězdoplavba, do polígrafo tcheco Jan Křesadlo (na verdade, o pseudônimo de Václav Pinkava), publicada por Ivo Železný, editor famoso por seu trabalho de popularização do esperanto. Trata-se de um livro espantoso, que chegou dessa terra distante (ao menos de meu ponto de vista, um pedestre do hemisfério sul), que se dissolve em uma bruma igualmente imaginária, a terra do Golem e de Kafka, da República Checa, de uma pequena cidade cuja curiosa sonoridade do nome, para um falante do português, soa ao mesmo tempo poética e feérica. Ao abrir o pacote, me deparei com um alentado tomo, em um estojo de papelão sólido. Esses estojo, ao mesmo tempo rústico e funcional, realizado com perícia, deixava ver em sua capa apenas a assinatura do autor, em uma caligrafia convulsiva – uma segura antecipação do conteúdo do estojo, já visível na lombada do livro que tal arranjo mantinha exposto. Pois, de fato, esse conteúdo seria ainda mais surpreendente.

Livro único em mais de um sentido, Astronautilia/Hvězdoplavba será alvo de uma série de pequenos filmes e comentários, que inaugurará uma nova metodologia de nosso blog. Espero que seja do agrado de todos (em todo caso, enviem, se for o caso, comentários a respeito desse e de outros temas).
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